Dimensão simbólica
Começando pelo nome das personagens principais, há a referir que em ambas (Baltasar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas) é transmitida uma ideia de união. Complementaridade e perfeição, tanto pela simbologia do número sete como pelo par sol-lua (dia-noite). De acordo com a simbologia dos números, constata-se, também, que ambos os nomes representam perfeição, totalidade e até magia, pelo facto de serem trissílabos (e aqui reside a simbologia do número três).
Vários mutilados surgem na construção do convento ("isto é uma terra de defeituosos. um marreco, um maneta, um zarolho"), onde se inclui obviamente Baltasar. Tal situação poderá levar à interpretação simbólica da luta desmedida na construção de algo, como realização de um sonho. Baltasar, após ter perdido a mão esquerda, empreende outras lutas, na construção da passarola e na colaboração na edificação do convento de Mafra.
Simbolicamente, estas personagens representam perseverança, força e luta.
A riqueza interior de Blimunda apresenta-se, simbolicamente, pela força do seu olhar, possuidor de um poder mágico. O poder do olhar é um tópico tradicional na literatura, seja no tema da sedução seja no do reflexo dos sentimentos (os olhos como janela da alma). Aqui, o tópico do olhar está também ligado a um poder (de Blimunda), aquela que, pela visão, colhe metaforicamente as duas mil vontades necessárias para realizar o sonho do padre Bartolomeu. Trata-se das vontades humanas que, ao longo dos tempos, originaram o progresso do mundo com a invenção de "aparelhos voadores" e de todos os objectos concebidos pelo Homem. Não será por acaso que essas vontades sejam metaforizadas nas nuvens. As nuvens ocupam um lugar ascendente em relação à Terra.
Por estes aspectos, as vontades (nuvens) estão carregadas de um carácter eufórico (positivo), contudo, de difícil, acesso. Só uma personagem como Blimunda conseguiria dominar, penetrar neste mundo não material.
Ainda no que concerne à simbologia dos números, o sete não só aparece associado aos nomes de Baltasar e Blimunda como também à data e à hora da sagração do convento, aos sete anos vividos em Portugal pelo músico Scarlatti, às sete vezes que Blimunda passa por Lisboa à procura de Baltasar, às sete igrejas visitadas na Páscoa, aos sete bispos que baptizaram Maria Xavier Francisca comparados a sete sóis de ouro e prata nos degraus do altar-mor ("Sete bispos a baptizaram, que eram como sete sóis de ouro e prata nos degraus do altar-mor").
O número nove surge também a simbolizar insistência e determinação, quando Blimunda procura o homem amado durante nove anos. Este número encerra também simbolicamente a ideia de procura. Segundo Chevalier e Gheerbrant, o nove "simboliza o coroamento dos esforços, o concluir de uma criação", o que realmente acontece a Blimunda que, após os longos nove anos de busca, reencontra finalmente Baltasar - já não um encontro físico, mas místico e completo ("Naquele extremo arde um homem a quem falta a mão esquerda. (...) E uma nuvem fechada está no centro do seu corpo. Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda."). É a sublimação de um amor que se afirmou pela singularidade e naturalidade próprias de quem se diferencia, face a outros amores mais artificiais.
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