Morto D. Sebastião em Alcácer Quibir, e tendo sido Portugal anexado pela Espanha em 1580, Portugal estava perante o período mais negro da sua História: perdera toda a opulência e grandiosidade do início do século, com a batalha de Alcácer Quibir perdeu o melhor da sua juventude e dos seus militares, ficou endividado com o pagamento dos resgates e sofreu o domínio castelhano, que o vai oprimir. Nasce então uma versão particular de messianismo, sobretudo de influência judaica, o Sebastianismo: crê-se que toda esta opressão, todo este sofrimento, toda esta miséria, toda esta crise será vencida com o aparecimento de D. Sebastião (numa manhã de nevoeiro...), que libertará Portugal dos castelhanos e da sua opressão e lhe restituirá a antiga grandeza. Este sonho é sustentado e difundido por várias pessoas e de várias maneiras, em que sobressaem as Trovas do Bandarra de Trancoso - e, já no nosso século, a Mensagem de Fernando Pessoa.
O Sebastianismo transforma-se num mito: quando há épocas de crise aparece como uma esperança de melhores dias, de mais justiça e de maior grandeza. O mito (como é próprio dos mitos) foi sendo adaptado às realidades de cada momento. Em 1640, por altura da restauração da independência nacional, era D. João IV o "Encoberto".
Quinto Império:
Fernando Pessoa, na obra Mensagem, anuncia um novo império civilizacional, que, como Vieira, acredita ser o português. Para o Poeta, "A esperança do Quinto Império, tal qual em Portugal a sonhamos e concebemos, não se ajusta, por natureza, ao que a tradição figura. Nessa figuração tradicional, é este o seguimento dos Impérios: o Primeiro é o da Babilónia, o Segundo o Medo-Persa, o Terceiro o da Grécia e o Quarto o de Roma, ficando o Quinto, como sempre, duvidoso. Nesse esquema, porém, que é de impérios materiais, o último é plausivelmente entendido como sendo o Império de Inglaterra. Não é assim no esquema português. Esse, sendo espiritual, em vez de partir, como naquela tradição, do Império material de Babilónia, parte, antes, com a civilização que vivemos, do Império espiritual da Grécia, origem do que espiritualmente somos. E, sendo esse o Primeiro Império, o Segundo é o de Roma. O Terceiro o da Cristandade, e o Quarto o da Europa – isto é, da Europa laica de depois da Renascença. Aqui o Quinto Império terá de ser outro que o inglês, porque terá de ser de outra ordem. Nós o atribuímos a Portugal, para quem o esperamos”.
Desde o tempo das descobertas, com o conhecimento de novos mundos, que colocaram Portugal como referência obrigatória, sempre houve uma crença de perenidade e de uma missão civilizadora. Daí Fernando Pessoa, como o fizera Vieira, procurar atestar a sua grandiosidade e o valor simbólico do seu papel na civilização ocidental, acreditando no mito do Quinto Império. Ao longo da Mensagem, sobretudo da terceira parte, Pessoa exprime a sua concepção messiânica da história e sente-se investido no cargo de anunciador do Quinto Império, que não precisa de ser material, mas civilizacional.
Em Mensagem, as figuras históricas da epopeia camoniana surgem como personagens míticas que funcionam como modelos. O herói da Mensagem projecta-se para além do momento histórico em que a acção teve lugar, sendo a sua dimensão simbolica e mítica que importa enquanto marco na história da Humanidade. Este herói é predestinado, escolhido, sacralizado e situa-se no domínio do sonho, procurando contudo a superação dos limites que caracterizam a própria condição humana ("Deus quer, o homem sonha, a obra nasce"). Em síntese, pode dizer-se que o herói de Mensagem surge da necessidade de combater a estagnação que caracteriza Portugal do séc.XX, um Portugal sem glória que tem de renascer e regenerar-se. Essa constatação leva a que o poeta de Mensagem a fazer um apelo aos seus compatriotas, no sentido de iniciarem a sua acção na construção de um novo tempo, a era do Quinto Império com o seu Messias salvador. Mensagem e Lusíadas:
O projecto da Mensagem é o de superar o carácter obsessivo e nacional d’Os Lusíadas no imaginário mítico-poético nacional. Os Lusíadas conquistaram o título de “evangelho nacional” e foram elevados à categoria de símbolo nacional. A Mensagem logo no seu título aponta para um novo evangelho, num sentido místico, ideia de missão e de vocação universal. O próprio título indicia uma revelação, uma iniciação.
Pessoa previa para breve o aparecimento do “Supra-Camões” que anunciará o “Supra-Portugal de amanhã”, a “busca de uma Índia Nova”, o tal “porto sempre por achar”.
A Mensagem entrelaça-se, através de um complexo processo intertextual, com Os Lusíadas, que por sua vez são já um reflexo intertextual da Eneida e da Odisseia. Estabelece-se portanto um diálogo que perpassa múltiplos tempos históricos. Pessoa transforma-se num arquitecto que edifica uma obra nova, com modernidade, mas também com a herança da memória.
Em Camões, memória e esperança estão no mesmo plano. Em Pessoa, o objecto da esperança transferiu-se para o sonho, daí a diferente concepção de heroísmo.
Pessoa identifica-se com os heróis da Mensagem ou neles se desdobra num processo lírico-dramático. O amor da pátria converte-se numa atitude metafísica, definível pela decepção do real, por uma loucura consciente. Revivendo a fé no Quinto Império, Pessoa reinventou um razão de ser, um destino para fugir a um quotidiano absurdo. O assunto da Mensagem é a essência de Portugal e a sua missão por cumprir. Portugal é reduzido a um pensamento que descarna e espectraliza as personagens da história nacional. Os Lusíadas e Mensagem:
A par das afinidades que se possam estabelecer entre as duas obras, ressaltam inúmeras diferenças, a primeira das quais diz respeito à temporalidade nelas reflectida: início do império e fase terminal de dissolução do mesmo. Para além desta, encontram-se ainda outras diferenças:
OS LUSIADAS
MENSAGEM
Herói colectivo: o povo português
Heróis individuais e exemplares
Heróis de carne e osso, valentes, de dimensão heróica mas verosímil
Heróis mitificados, carregados de dimensão Simbólica
D. Sebastião – rei a quem a obra é dedicada
D. Sebastião – rei desaparecido e transformado em mito, em sonho, em ideal
Celebração da história, do passado e visão crítica do presente (o do Poeta)
Messianismo e glorificação do futuro
Realidade histórica inspira a produção épica
Simbolismo das figuras representadas
Dinamismo, acção, conflito
Contemplação, sonho
Construção do Império material; glorificação do herói
Construção e destruição do império material; aspiração ao império espiritual
Temporalidade precisa
Transtemporalidade mística e mítica
Feitos concretos
Matéria dos sonhos
D. Sebastião – eleito por Deus para alargar a Cristandade
Portugal - instrumento de Deus onde os heróis cumprem um destino que os ultrapassa (veja-se o poema "D. João, o Primeiro")
Portugal – cabeça da Europa
Portugal - rosto da Europa que "fita" o futuro
Império terreno
Império espiritual
Em termos de semelhanças pode salientar-se: a presença de poemas sobre Portugal e os portugueses; a concepção de D. Sebastião como ser eleito; a vontade divina de se concretizar através de heróis predestinados; a existência de fragmentação na apresentação dos heróis; a exaltação épica da acção humana; o destaque para a superioridade dos marinheiros portugueses relativamente aos da antiguidade; a assunção do sacrifício em nome da Pátria; o surgimento da gloria marcada pelo sofrimento e por lágrimas; a evocação do passado com o objectivo de projectar ou idealizar o futuro.
Estrutura Tripartida (símbolo da perfeição e do mistério):
Brasão - Onde desfilam os heróis lendários e históricos construtores do Império, associados à fundação e às origens. Remetem para a conquista da Terra. Simboliza o nascimento da Pátria ("Ulisses", "D. Dinis", "D.Fernando").
Mar Português - Onde surgem poesias inspiradas na ânsia do Desconhecido e no esforço heróico da luta com o Mar. Exalta heróis e momentos dos Descobrimentos. Salienta a grandeza do sonho convertido em acçao, unifica o acto humano com a vontade de Deus (concepção messiânica da história)("O Infante", "O Mostrengo", "Mar Português", "Horizonte"). Simboliza a vida adulta da Pátria.
Encoberto - Onde apresenta o Império moribundo, onde o caos reina e Portugal vive numa crise profunda. Contudo, o poeta considera que é Hora de despertar para a construção de um novo Império diferente dos anteriores: o Quinto Império, um reino de liberdade, sem fronteiras geográficas ou politicas, um Império de natureza cultural e linguística. Neste sonho, a cultura e a língua de Portugal deverão ser o centro e o pólo dinamizador de um vasto Império cultural (profecia). Simboliza a Morte da Pátria, nao um fim absoluto, mas encerrando o gérmen da ressurreição.
O livro estrutura-se em torno de 3 conceitos fundamentais:
Herói - Aquele que interpreta a vontade divina, actuando para dar cumprimento a uma vontade que lhe é superior, tranformando-se em mito. É o predestinado, o escolhido, aquele a quem Deus dá a espada ungida para cumprir a sua missão ("Deus quer, o homem sonha, a obra nasce").
Sebastianismo - Pessoa evoca as raízes do passado e defende o renascer de um nacionalismo profético voltado para o futuro com fé, crença e esperança.
Quinto Império - Este conceito liga-se ao sebastianismo e remete para o renascer de um Império espiritual e eterno.
Mensagem é um poema que apresenta uma estrutura tripartida, construindo o ciclo de vida da Pátria eterna, que vai gerando Impérios efémeros e sucessivos, sempre numa perspectiva de renovação e regeneração e como expressão poética de mitos. Deste modo, Brasão remete para o nascimento da Pátria e nele o poeta evoca os fundadores e antepassados que criaram a Pátria e fundaram a nacionalidade; Mar Português equivale á vida adulta da Pátria que se realiza através do mar projectando-se na conquista do Império. Agora os homens sacralizados que têm a grande missão de descobrir o mar e assim construir o grande destino da Nação. Finalmente, O Encoberto retrata o fim das energias latentes e mostra-nos uma Pátria moribunda cujo choro se ouve e onde a esperança persiste como chama que é necessário atear com a coragem e a fé. Assim, de novo surgirá a regeneração, se instaurará um novo ciclo e das cinzas o gérmen da ressurreição fará renascer a Pátria que reiniciará um novo caminho à procura de uma gloria infinita.
Carácter épico-lírico da obra: Mensagem é uma colectânea que reúne poemas de carácter nacionalista e sebastianista, a única publicada em vida do seu autor, em 1934, numa época em que a Pátria vivia num momento de decadência, tinha-se perdido a identidade pessoal, os feitos heróicos estavam longínquos e já só restava a memoria dessa gloria distante. Nesta perspectiva, para fazer ressurgir das cinzas a nação, Fernando Pessoa acreditava no destino messiânico de Portugal e acreditava também que o saudosismo que preenchia o coração dos portugueses poderia ser o ponto de partida para a tentativa de recuperação da gloria que morrera no passado. Então, Pessoa enuncia e exalta heróis e factos históricos, enaltecendo e enobrecendo a grandiosidades dos acontecimentos que construíram a Historia Nacional. Quer no Brasão, quer no Mar Português desfilam heróis e momentos que foram importantes na construção do Império e são exaltados de forma heróica de modo a conferir à obra um profundo carácter épico. Contudo, paralelamente, é notório que essa exaltação é sentida e filtrada por um "Eu" que impregna os poemas de subjectividade, expressa os seus sentimentos, retrata a sua alma e faz a análise introspectiva, transpondo para os textos uma carga simbólica importante e significativa. Deste modo, pode dizer-se que a Mensagem possui um carácter épico-lírico pois ao mesmo tempo que enaltece a heroicidade do ser humano trazendo até ao presente moribundo o passado de gloria e heroísmo, o poeta tira partido do mito sebastianista e evidencia a ideia profética que através do sonho, se poderá construir um Império perfeito e espiritual que teria como finalidade construir a paz universal.
Definição de Herói - Um herói é um ser excepcional que se afasta do ser banal e vulgar e funciona como modelo ideal a seguir. A mitificação do herói processa-se e consegue-se através da força e da capacidade que estes evidenciam, nunca deixando de arriscar e ultrapassando todos os obstáculos. Assim, o herói é aquele que se eleva acima do ser humano e se imortaliza, é o semi-Deus que alcança uma posição intermédia entre o humano e o divino e partilha das características de ambos: sendo humano, morrerá nele o corpo; sendo divino ficará imortal o seu nome na glória eterna dos deuses. Na obra Os Lusíadas, o herói da epopeia caracteriza-se pelos feitos grandiosos, nunca antes realizados por humanos, pela conquista da Imortalidade, devido a esses feitos, pela ascensão dos homens à condição divina, como é visível na Ilha dos Amores e pela superação dos heróis das epopeias antigas. na verdade, o herói da epopeia vai-se progressivamente construindo á medida que a viagem avança, mas só porque vai vencendo graças á sua coragem e ousadia, todos os obstáculos e perigos, mas também porque suplanta as forças da natureza, vence os deuses e ainda porque vai detendo um novo saber, adquirido através das suas vivências e experiências e que, por esse motivo, engrandece o espírito humano ( Fogo-de-Santelmo e Tromba Marítima). Contudo, é na Ilha dos Amores que se assiste á realização daquilo que constitui a essência da epopeia: o poeta torna imortais os feitos dos portugueses, elevando-os á categoria de deuses, para sempre eternos na memoria dos homens. Pode então dizer-se que Os Lusíadas apresentam um homem que "é a medida de todas as coisas", numa visão antropocentrista do mundo em detrimento da visão teocentrista em que a razão se sobrepõe ao dogma. É a apologia do saber, da experiência e da crença nas capacidades dos Homem, em perfeita consonância com o espírito renascentista, onde o herói se eleva á medida do seu esforço.
Os Lusíadas são uma epopeia onde se exaltam os feitos heróicos do povo português e onde se enaltece a glória desse povo que fundou a Nacionalidade e conquistou um Império vastíssimo. Vasco da Gama narra ao Rei de Melinde a história de Portugal e a sua viagem de Lisboa até Melinde sempre numa perspectiva de exaltação e glória que abrange os planos da História e da Viagem. Contudo, para além de todo o enaltecimento, emerge o plano das reflexões do poeta onde surge uma face nocturna e sombria da epopeia, visto que nas suas considerações o poeta lamenta, critica e denuncia certos comportamentos e actividades, evidenciando um certo sentimento de crise que começa a instalar-se e a conduzir a pátria para a decadência. Na verdade, o poeta lamenta o facto da pátria portuguesa estar mergulhada no materialismo e rejeitar a vertente cultural, denunciando o facto de haver um desencontro entre a politica e a cultura, o que não permite a evolução e o crescimento. Tornado-se a si como exemplo, o poeta lamenta ainda de não o reconhecerem nem valorizarem e insiste na necessidade de que a pátria não pode continuar mergulhada na ambição, na cobiça e no materialismo, caso contrário caminhará rapidamente para a estagnação. Episódio do Velho do Restelo: O velho é humanista, logo é contra a guerra e como tal condena todos os conflitos. Simboliza a corrente de oposição à expansão marítima, mais concretamente a velha nobreza com o seu espírito de cruzada, que considerava a expansão a principal causadora da decadência moral do reino. As cousas do mar: Ao nível da estrutura, as estrofes situam-se no canto V de Os Lusíadas e no que se refere à estrutura interna situa-se na narração, quando as naus estão em Melinde e Vasco da Gama conta ao rei Mouro, em analepse, as viagens de Lisboa até Melinde. Neste caso especifico, o Gama relata os perigos de viagem, mais concretamente o fogo-de-Santelmo e a tromba marítima. Trata-se de uma descrição dinâmica dos fenómenos onde sobressai recursos estilísticos como o pleonasmo como reforço do saber empírico, adjectivação expressiva ( "vivo", "esquivo", "escura", "triste"), verbos expressivos que conduzem á sensação visual como, por exemplo, enche, alarga, surver. A descrição dos fenómenos, em especial da tromba marítima é tão pormenorizada que permite construir uma imagem visual da mesma (est. 19 e 20) - Registe-se o destaque para o verbo ver que denota certeza, realismo e verdade; entrelaçam-se nestas estrofes 2 tipos de saberes: o saber empírico ( possuído pelos marinheiros e resultante da sua experiência e da observação directa de fenómenos) e o saber cientifico ( pertence aos sábios, um saber teórico, mais incompleto e menos real). Camões foi um humanista, conhecedor de toda a cultura greco-latina e, paralelamente de todo o conhecimento cientifico, soube entrelaça usando a sua experiência de viajante por mar, o conhecimento empírico, através do qual é possível descrever minuciosamente os fenómenos observados directamente. Neste âmbito, o saber empírico passou a ser valorizado e contribuiu fortemente para o enriquecimento do saber cientifico.
Reflexões do poeta, n’ Os Lusíadas:
Na primeira reflexão d'Os Lusíadas, sobre a insegurança da vida, Camões reage à traição protagonizada por Baco, lamentando-se da personalidade escondida dos seres humanos. Estabelece um paralelismo entre os perigos encontrados no mar e em terra, verificando que em nenhum dos ambientes há, segurança absoluta. Na sequência disto, reflecte sobre a posição do ser humano face à natureza, já que na sua fragilidade. e insegurança é capaz de atravessar mares e conquistar povos, ultrapassando com sucesso os diferentes obstáculos.
A reflexão sobre a dignidade das Artes e das Letras é um episódio marcadamente Humanista. Isto é observável noutras partes da obra pela demonstração da vitória do Homem sobre a Natureza e a vontade de saber e descobrir. No que se refere a este trecho específico, o Humanismo revela-se pela presença da componente pedagógica oferecida pelas artes e letras" e pelo modelo de perfeição humana que é a capacidade de conjugar os feitos guerreiros com o conhecimento literário, objectivo conseguido pelos chefes da antiguidade (como seja o exemplo citado de César).
Camões alegra-se ao verificar que na Antiguidade sempre houve personagens protagonistas de feitos heróicos e simultaneamente autores capazes de os cantar condignamente. Em oposição, lamenta-se do facto de, apesar de os portugueses terem inúmeros feitos passíveis de serem louvados, não ser prezada a poesia, tornando-o num povo ignorante. Na sequência disto, caso continue a não haver em Portugal uma aposta nas artes, nunca ninguém exaltará os feitos dos portugueses.
Apesar de tudo, Camões vai continuar a escrever a sua obra, por amor e gosto à arte de louvar, mesmo sabendo de antemão que o mais provável é não ver) devidamente reconhecidos os seus versos.
No final do canto VI, Camões apresenta-nos o seu conceito de nobreza, recorrendo para isso à oposição com o modelo tradicional. Desta forma, o poeta nega a nobreza como título herdado, manifestada por grandes luxos e ociosidade. Propõe então, como verdadeiro modelo de nobreza, aquele que advém dos próprios feitos, enfrentando dificuldades e ultrapassando-as com sucesso. Só assim poderá superiorizar-se aos restantes homens e ser dignamente considerado herói. O estatuto será adquirido ao ver os seus feitos reconhecidos por outros e, mesmo contra a sua vontade, ver-se-á distinguido dos restantes.
Na reflexão que faz no início do canto VII, Camões faz um elogio ao espírito de cruzada e critica os que não seguem o exemplo português. Isto porque, para Camões, a guerra sem pretensões religiosas não faz sentido, visto ser apenas movida" pela ambição da conquista de território. Assim, recorre ao exemplo do Luteranismo alemão para criticar a oposição ao Papa e às guerras que não seguem os ideais camonianos.
Dirige-se depois aos ingleses, que deixam que os Muçulmanos tenham sob controlo a cidade de Jerusalém e preocupa-se apenas em criar a sua nova forma de religião (anglicanismo). Também os franceses, ao invés de combaterem os infiéis, aliaram-se aos turcos para combater outros cristãos. Nem os próprios italianos passam impunes, ao ser-lhes criticada a corrupção. Para incitar à conquista de povos não -cristãos, visto esta causa não ser suficiente, Camões lembra as riquezas da Ásia Menor e África, incitando desta forma a expansão. Termina elogiando os portugueses, que se expandiram por todo o mundo tendo como fim primário a divulgação da fé.
Na segunda reflexão que faz no canto VII, Camões critica os opressores e exploradores do povo. Começa por uma retrospectiva da sua própria vida, com etapas como a pobreza, a prisão, o naufrágio, fazendo destas um balanço negativo. No entanto, para ele a maior desilusão continua a ser o facto de não ver a sua obra devidamente reconhecida. Alerta portanto para o facto de os escritores vindouros se poderem também sentir desta forma, desencorajando a escrita e a exaltação dos heróis. Segue depois para uma" crítica mais abrangente, afirmando que não louvará quem se aproxima do Rei tendo como intentos únicos a fama e o proveito próprio. Não louvará também aqueles que se inserem nos meios reais de forma a conseguirem poder para explorar o povo. Termina invejando aqueles que em serviço do Rei foram reconhecidos, já que ele se sente cansado pela forma como é tratado pelos compatriotas.
No final do canto VIII, Camões centra a sua reflexão nos efeitos perniciosos do ouro, constatando que a avidez em que vive o ser humano conduz muitas vezes a acções irreflectidas, independentemente da posição social. Lista todos os efeitos do metal precioso, desde traições à corrupção da ciência, ao afirmar que o ouro. Pode fazer com que os juízes dêem demasiada importância a uma obra pelo facto de terem sido remunerados para tal.
No final da obra, Camões lamenta-se do facto de não estar a ser devidamente reconhecido, já que a sociedade se rege somente pelo dinheiro, decidindo por isso pôr-lhe termo. Não deixa no entanto de louvar os portugueses e todos os perigos por eles ultrapassados (definição camoniana de nobreza). Elogiando os heróis passados, alerta os homens do presente que a vida nobre não passa pelo ouro, cobiça e ambição.
Exorta D. Sebastião a valorizar devidamente aqueles que pelos seus feitos se puderem considerar nobres. Correspondendo à visão aristotélica" da epopeia, remata com novas proposição e dedicatória e incita o rei a feitos dignos de serem cantados.
Título: Lusíadas - significa 'Lusitanos', ou seja, são os próprios lusos, em sua alma como em sua ação.
Estrutura Externa d'Os Lusíadas:
A obra divide-se em dez partes, às quais se chama cantos. Cada canto tem um número variável de estrofes (em média de 110). O canto mais longo é o X, com 156 estrofes.
As estrofes são oitavas, portanto constituídas por oito versos. Cada verso é constituído por dez sílabas métricas; nas sua maioria, os versos são heróicos (acentuados nas sextas e décimas sílabas).
O esquema rimático é o mesmo em todas as estrofes da obra, sendo portanto, rima cruzada nos seis primeiros versos e emparelhada nos dois últimos (AB-AB-AB-CC).
Estrutura interna d'Os Lusíadas:
1 - As partes constituintes:
Os Lusíadas constroem-se pela sucessão de quatro fontes:
Proposição – parte introdutória, na qual o poeta anuncia o que vai cantar (Canto I, estrofes 1-3);
Invocação – pedido de ajuda as divindades inspiradores (A principal invocação é feita as Tágides, no canto I, estrofes 4 e 5, ás Ninfas do Tejo e do Mondego, no canto VII 78-82 e, finalmente, a Calíope, no Canto X, estrofe 8);
Dedicatória – oferecimento do poema a uma personalidade importante. (Esta parte, facultaria, pode ter origem nas Geórgicas de Virgílio ou nos Fastos de Ovídio; não existe em nenhuma das epopeias da Antiguidade);
Narração – parte que constitui o corpo da epopeia; a narrativa das acções levadas a cabo pelo protagonista. (Começando no Canto I, estrofe 19, só termina no Canto X, estrofe 144, apresentando apenas pequenas interrupções pontuais).
2 - Os planos narrativos:
Obra narrativa complexa, Os Lusíadas constroem-se através da articulação de três planos narrativos, não deixando, ainda assim, de apresentar uma exemplar unidade de acção.
Como plano narrativo fuleral apresenta-nos a viagem de Vasco da Gama à India. Continuamente articulado a este e paralelo a ela, surge um segundo plano que diz respeito à intervenção dos deuses do Olimpo na Viagem. Encaixado no primeiro plano, tem lugar um terceiro, que é constituído pela História de Portugal, contada por Vasco da Gama ao rei de Melindo, para Paulo da Gama e por entidades dividas que vaticinam futuros feitos dos Portugueses.
Termo cuja utilização se generalizou, ao longo do século XIX, para designar uma tendência estética. O termo classicismo é ainda, sob uma perspectiva histórica mais alargada, tido como abarcando também o barroco e o maneirismo, considerando-se que apenas o Romantismo introduz concepções artísticas radicalmente diferentes. O classicismo toma por modelos as formas, regras e temas da arte da antiguidade greco-romana.
De forma geral, o início do classicismo coincide com o período Renascentista; a recuperação de modelos e valores da cultura antiga greco-latina acompanha o crescimento do interesse pelo humano, estranho à tradição escolástica medieval. A assimilação dos preceitos clássicos foi heterogénea, no tempo e no espaço.
Nos finais do século XVIII, o classicismo renova-se com o neoclassicismo.
Doutrina centrada nos interesses e valores humanos. Num sentido mais restrito, o termo designa também um movimento intelectual europeu do Renascimento, que influenciou a cultura da época nas vertentes literária e artística. Caracterizou-se pela valorização do espírito humano e por uma atitude crescentemente individualista, a par de um grande interesse pela redescoberta das obras artísticas e literárias da antiguidade clássica. Estabeleceu-se então o ideal do homem renascentista, que deveria ser simultaneamente um poeta, um erudito e um guerreiro.
Nesta acepção, o humanismo teve origem nos estudos literários levados a cabo nos séculos XIII e XIV por homens de letras como Petrarca. Na época, o humanismo ganhou maior peso com os estudos de textos literários do passado, resultando na redescoberta, para o ocidente, do grande acervo da literatura grega clássica. Em Portugal o humanismo atingiu o seu ponto alto no século XVI, fomentado pela universidade e, sobretudo, pela criação, em Coimbra, do Colégio das Artes (1548).
Movimento cultural que se desenvolveu na Europa ao longo dos séculos XV e XVI, com efeitos nas artes, nas ciências e em outros ramos da actividade humana. As cidades italianas foram pioneiras neste movimento intelectual.
No centro da transformação intelectual renascentista encontra-se a passagem de uma mentalidade teocêntrica (que colocava Deus no centro da reflexão humana) a uma mentalidade antropocêntrica (que via o homem como centro). Esta proposta correspondia a um reconhecimento e a uma crença optimista nas capacidades e no valor do ser humano, contrapondo-se à visão medieval do mundo.
O termo Renascimento está ligado ao facto de, neste período, os eruditos europeus terem voltado a sua atenção para as grandes obras da antiguidade clássica, que acreditavam terem sido esquecidas durante a Idade Média. Nelas encontravam as raízes das questões básicas que pretendiam responder alguns dos seus problemas. As obras clássicas eram também modelo para as obras que pretendiam criar.
Em Portugal, a difusão do humanismo foi fomentada pelo envio de bolseiros a outros pontos da Europa e pela vinda de estrangeiros a Portugal, apesar da difusão dos ideais renascentistas ter sido dificultada pela Inquisição, instituída em Portugal em 1537.
Luís de Camões nasceu em 1524 ou 25, provavelmente em Lisboa, filho de Simão Vaz de Camões e Ana de Sá.
Tudo parece indicar, embora a questão se mantenha controversa, que Camões pertencia à pequena nobreza, embora a situação de nobre não constituía qualquer garantia económica.
Os vastos conhecimentos e cultura do poeta são normalmente justificados por este ter frequentado o ensino superior. Camões provavelmente estudou em Coimbra, apesar de nenhum documento atesta a veracidade desta hipótese, embora não haja dúvida de que o poeta tenha passado pela Universidade.
Antes de 1550 estava a viver em Lisboa, onde permaneceu até 1553. Essa estadia foi interrompida por uma expedição a Ceuta onde foi ferido e perdeu um olho.
Descobriu-se, através do calão conceituoso, retorcido e sarcástico, um homem que escreve ao sabor de uma irónica despreocupação, vivendo apenas do destino, boémio e desregrado. Divide-se entre as amantes (sem pruridos sobre a qualidade das mulheres com quem priva) e a estroinice de bandos de rufiões, ansiosos por rixas de taberna ou brigas de rua onde possam dar largas ao espírito valentão, sem preocupações com a nobreza das causas por que se batem.
Na sequência de uma desordem ocorrida no Rossio, em dia do Corpo de Deus, na qual feriu um tal Gonçalvo Borges, foi preso por largos meses na cadeia do Tronco e só saiu – apesar de perdoado pelo ofendido – com a promessa de embarcar para a Índia. Foi soldado durante três anos e participou em expedições militares que ficaram recordadas na elegia.
Esteve também em Macau, ou noutros pontos dos confins do Império, desempenhando as funções de provedor dos bens dos ausentes e defuntos.
Não é ponto assente. Mas o que se sabe é que a nau em que regressava naufragou e o poeta perdeu o que tinha amealhado, salvando a nado Os Lusíadas na foz do rio Mecon, episódio a que alude na estância 128 do Canto X.
Vem até Moçambique a expensas do capitão Pero Barreto Rolim, mas em breve entra em conflito com ele e fica preso por dívidas. Diogo do Couto relata mais este lamentável episódio, contando que foram ainda os amigos que vinham da Índia que, ao encontrá-lo na miséria, se cotizaram para o desempenharem e lhe pagarem o regresso a Lisboa. Diz-nos ainda que, nessa altura, além dos últimos retoques nos “Os Lusíadas”, trabalhava numa obra lírica, o Parnaso, que lhe roubaram – o que, em parte, explica que não tenha publicado a lírica em vida.
Chega a Lisboa em 1569 e publica Os Lusíadas em 1572, conseguindo uma censura excepcionalmente benévola.
Apesar do enorme êxito do poema e de lhe ter sido atribuída uma tença anual de 15000 réis, parece ter continuado a viver pobre.
Morreu em 10 de Junho de 1580. Algum tempo mais tarde, D. Gonçalo Coutinho mandou gravar uma lápide para a sua campa com a citação:
“Aqui jaz Luís de Camões, Príncipe dos Poetas de seu tempo. Viveu pobre e miseravelmente, e assim morreu”.
- Exprime o tédio, o cansaço, a naúsea, o abatimento e a necessidade de novas sensações;
- Traduz a falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à monotonia;
- Marcado pelo romantismo e simbolismo (preciosismo, símbolos e imagens).
2ª Fase de Álvaro de Campos - Futurista/Sensacionista
Nesta fase, Álvaro de Campos celebra o triunfo da máquina, da energia mecânica e da civilização moderna. Sente-se nos poemas uma atracção quase erótica pelas máquinas, símbolo da vida moderna. Campos apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina por oposição à beleza tradicionalmente concebida. Exalta o progresso técnico, essa “nova revelação metálica e dinâmica de Deus”. A “Ode Triunfal” ou a “Ode Marítima” são bem o exemplo desta intensidade e totalização das sensações. A par da paixão pela máquina, há a náusea, a neurastenia provocada pela poluição física e moral da vida moderna.
- celebra o triunfo da máquina, da energia mecânica e da civilização moderna;
- apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina;
- exalta o progresso técnico, a velocidade e a força;
- procura da chave do ser e da inteligência do mundo torna-se desesperante.
3ª Fase de Álvaro de Campos -Intimista
Esta fase caracteriza-se por uma incapacidade de realização, trazendo de volta o abatimento. O poeta vive rodeado pelo sono e pelo cansaço, revelando desilusão, revolta, inadaptação, devido à incapacidade das realizações. Após um período áureo de exaltação heróica da máquina, Álvaro de Campos é possuído pelo desânimo e frustração. Parece apresentar pontos comuns com a 1ª fase – a decadentista - , contudo, há que sublinhar que a intimista traduz a reflexão interior e angustiada de quem apenas sente o vazio depois da caminhada heróica.
Nesta fase, Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido ("O que há em mim é sobretudo cansaço –"; "Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles: / porque amo infinitamente o finito, / Porque eu desejo impossivelmente o possível"). A construção antitética destes versos é, sem dúvida, o espelho do interior do poeta.